O cinema africano no espaço escolar
Washington Santos Nascimento*
O
uso do cinema em sala de aula constitui-se uma ferramenta indispensável para o
entendimento da história africana. Nos últimos anos o grande público tem
assistido a uma grande quantidade destes filmes, sobretudo filmes de ação como
Falcão Negro em perigo (2002, Ridley Scott), Lágrimas do Sol (2003, Antoine
Fuqua), Hotel Ruanda (2004, Terry George), O Senhor das Armas (2005, Andrew
Niccol), Diamante de Sangue (2006, Edward Zwick) e O Último Rei da Escócia
(2006, Kevin Macdonald). Romances como Amor sem fronteiras (2003, Martin
Campbell), A Massai Branca (2005, Hermine Huntgeburth). Dramas: O Jardineiro
Fiel (2005, Fernando Meirelles), A Intérprete (2005, Sidney ,Pollack) e Babel (2006,
Alejandro González Iñárritu).
Entretanto
estes filmes se passam na África, mas geralmente os protagonistas não são
africanos, ou seja, o cenário é o continente africano, mas seu povo não é
protagonista. Normalmente tais filmes apresentam duas vertentes básicas, que
não se excluem, acabam por sendo complementares, primeiro são filmes que vitimam
o africano, destituindo-os de sua capacidade política, como seres passivos,
vítimas, incapazes de mudar seu destino, o destino do seu país e continente,
por isto precisam da ajuda humanitária dos países desenvolvidos.
Em
uma segunda linha, mas complementar em relação à primeira, são em grande parte
filmes que ressaltam a África enquanto um espaço de pobreza, ditadores, tráfico
de armas, guerras civis, violência, selvageria... Fazendo uso assim de imagens
canônicas (imagens-padrão), estereotipadas e continuamente reiteradas em
relação ao continente africano.
Neste
cinema comercial há também um segmento a parte, que são os filmes em torno de
Nelson Mandela, que de certa maneira acaba também reiterando determinados
estereótipos com uma idealização (em graus variáveis) em torno do líder
sul-africano, a exemplo de Mandela: Luta pela
Liberdade (2007), Mandela ( 2009 de Justin Chadwick) e Invictus (2010, Clint Eastwood). Isto sem falar do sem numero de filmes
infantis, que vão do Rei Leão (1994, Roger Allers) a Madagascar (2005, Eric
Darnell). Mesmo nestes filmes o reforço das imagens do continente africano
enquanto espaço exótico e selvagem é recorrente.
Excluindo-se algumas produções pontuais e
vinculadas aos centros mais antigos, como por exemplo o Egito, o cinema
africano, sobretudo dos países de colonização portuguesa, surgiu por volta da
década de 60 do século XX ele foi de alguma forma resultado das lutas dos povos
africanos pela independência e eles são instrumentos indispensáveis para um
mergulho no mundo africano, com suas mazelas, questões, mas também com a beleza
de sua diversidade.
A
partir de nossa participação em fóruns de discussão como o Núcleo de Apoio a Pesquisa
Brasil África da USP (http://brasilafrica.fflch.usp.br/) e o GT de
Africa da ANPUH e de suas listas de pesquisa e eventos como mostras de cinema
realizadas na UFMG, UFBA, UFRJ, UFF, PUC-SP, USP..., Bem como a análise de
alguns sites e blogs voltados ao cinema africano, como cine-africa.blogspot.com.br,
guerracolonial.home.sapo.pt/filmografia/filmes.html e mostraafricahoje.blogspot.com.br/
Além
disso a nossa experiência de docente na área desde 2007 selecionamos uma série
de filmes e curtas que podem ser úteis em sua utilização em sala de aula. Trata-se
de uma relação bem parcial e de certa maneira precária, diante da diversidade
que é a produção cinematográfica africana, além do que é uma tarefa
desafiadora, fazer uma relação de filmes sobre um continente inteiro.
Não
se constitui tarefa nossa fazer uma discussão sobre a utilização metodológicas
destes filmes, mas é sempre bom lembrar que quase sempre o filme é utilizado como uma ilustração do
conteúdo dado, entretanto o filme, entendido enquanto uma produção artística e
cultural, pode e deve ser bem mais do
que uma ilustração. Além disto ele deve transcender a sala de aula, adentrando
em todo o espaço espaço escolar com a construção por exemplo de mostras de
cinemas.
Abaixo
listamos uma serie de filmes e curtas, divididos em diferentes temáticas, e em
alguns casos os links para alguns trailers.
Provavelmente alguns dos links colocados neste texto podem estar
desativados quando vocês forem acessar, minha sugestão é colocar o nome do
filme completo no google ou youtube que provavelmente ele será novamente
localizado.
África Ocidental
Kiriku e a feiticeira: Direção: Michel
Ocelot. Kirikou et la sorcière, França/Bélgica,1998.
Sinopse: Kiriku
é um menino que já falava quando ainda estava na barriga da mãe. A história faz
parte da cultura africana e trata da determinação na luta pela liberdade.
“Kiriku nasce para ser livre, tanto que quando ainda está na barriga da mãe ele
diz: “Mãe, dê a luz a mim!” Segundo o diretor e roteirista Michel Ocelto, foi
também uma grande oportunidade para mostrar o povo africano e alguns de seus
valores. O roteiro foge do óbvio, ao contrário do que acontece em outras
produções do gênero. E conta ainda com boa trilha sonora e
personagens cativantes”.
Público Alvo: Fundamental II
Trailer:
# É possível achar o filme complete na livraria
paulinas ou mesmo no youtube
Colonialismo na África
A Batalha de Argel: (Argélia e Itália, 1966)
Sinopse: Dirigido
pelo italiano Gillo Pontecorvo (1919 - 2006), o filme apresenta momentos
decisivos da guerra pela independência da Argélia (1954 - 1962), marco no
processo de libertação das colônias africanas. Enfocando o período entre 1954 e
1957, o longa-metragem mostra como agiam os dois lados do conflito: o exército
francês recorria à tortura e à execução dos inimigos e a FLN (Frente de
Libertação Nacional) usava técnicas de guerrilha e de terrorismo.
Público Alvo: Ensino Médio
O Herói ( Zezé Gamboa, 2004)
Sinopse: Após
uma violenta guerra civil de 27 anos, Angola encontra-se numa situação em que
tudo está por refazer. A reconstrução Nacional passa necessariamente pelo reencontro
de valores morais e pela reintegração de seres por vezes perdidos e mutilados
física e espiritualmente, que precisam encontrar o seu lugar como elementos
válidos de uma sociedade, ela própria em reanimação, e reencontrar a sua
dignidade como humanos.
Apartheid
Distrito 9
Sinopse: Um
blockbuster com idéia, diretor e elenco sul-africanos. uma nave alienígena
'encalha' sobre a cidade de Johannesburg. os seus milhares de tripulantes
acabam isolados num gueto, submetidos à violência da polícia local e negociando
com contrabandistas. curioso paralelo com o apartheid, neste bom filme
produzido por Peter Jackson)
África Contemporânea
Mãe dos Netos (de Isabel
Noronha)
Sinopse: "Mãe dos Netos” é uma das inúmeras
histórias resultantes do drama do HIV/AIDS em Moçambique que,
inexoravelmente, vai rasgando o tecido familiar criando um vazio de figuras
adultas e deixando nas mãos dos idosos o cuidado de um sem número de
crianças.
Usando como técnica uma mistura de animação e documentário, este pequeno filme narra a história de Vovó Elisa cujo filho e as respectivas oito esposas faleceram, deixando ao seu cuidado crianças. Karingana Wa Karingana, era uma vez “Ngwenya” (Isabel Noronha)
Sinopse: Mais do que um filme sobre a vida e obra
do Pintor Malangatana, este filme é uma viagem ao universo de um Homem que,
não só se tornou um mito, como criou, mais do que uma linguagem artística
própria, uma verdadeira Língua para escrever um mundo inscrito dentro de si.
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Le Mandat (De Sembene Ousmane de 1986)
Sinopse: De
Sembene Ousmane. Com Isseu Niang, Mamadou Zerbo. Drama em cores/86’. Em Dakar,
Ibrahima Dieng, muçulmano senegalês, vive bem, sem trabalhar, com suas 2
esposas e seus 7 filhos. Um dia, recebem um vale-postal de um sobrinho que vive
na França. Todos ficam sabendo, as mulheres compram a crédito, os parentes
pedem colaborações e outros tentam extorquir o dinheiro. O vale-postal, simples
pedaço de papel, em vez de trazer riqueza e gratidão, torna-se símbolo de
vergonha e decadência. O filme é um retrato engraçado e contundente
da nova sociedade senegalesa.
Fintar o Destino (Fernando Vendrell de 1997)
Sinopse: A
amarga crónica de um homem que perdeu a oportunidade de sair de Cabo Verde para
ser futebolista no Benfica e nunca conseguiu ultrapassar, ao longo de toda uma
vida, a sensação de frustração e vazio. "Fintar o Destino" é o
envolvente retrato humano e psicológico de um homem que fica face a face com o
vazio da sua vida, marcada pela nostalgia amarga dum passado falhado como
futebolista. Uma primeira obra de Fernando Vendrell, construida com
sensibilidade e inteligente ironia.
Mulheres Africanas
Sinopse: Este
documentário apresenta a trajectória de lutas e conquistas históricas das
mulheres africanas em diferentes países do continente. São retratadas não
apenas mulheres líderes que se têm destacado em diferentes áreas, mas também as
mulheres comuns, igualmente corajosas e vitoriosas em suas lutas do dia-a-dia.
Conta com depoimentos de grandes líderes como Graça Machel, Leymah Gbowee, Sara
Masasi, Nadine Gordimer e Luisa Diogo.
Trailer aqui
A Guerra da Água
Sinopse: Quatro
histórias cruzam-se numa aldeia moçambicana. Histórias sobre a importância de
uma lata com água, de um poço que se avaria, de um caçador solitário, de um
pássaro que, dentro de uma gaiola, se transforma num celular. A atravessar
todas estas histórias, a dignidade nos olhares das pessoas. São três as
personagens deste documentário: o poço, as mulheres e o embondeiro.
Um filme mágico.
Oxalá cresçam pitangas (2007, 62')
Sinopse: Documentário
dirigido pelo escritor angolano Ondjaki e pelo cineasta, também angolano
Kiluanje Liberdade. O documentário propõe uma viagem por Luanda,
independente de Portugal há mais de 30 anos. Através dos 10 personagens
descobrimos ocruzamento de várias realidades e gente de todas as províncias a
formar um elo com o resto do mundo.
Trailer
https://www.youtube.com/watch?v=17BJfqWfm3c
Sobre o filme
E não havia mais neve (Abacar Samb Makharam,
1965) Duração: 22 minutos
Sinopse: O
filme retrata a volta de um estudante africano para Senegal, seu país de
origem, depois de uma grande temporada em Paris. O regresso deste jovem coloca
em relevo todos os conflitos e tensões que envolvem a disputa de valores,
costumes e tradições entre a Europa Ocidental e a África. O jovem, dividido
entre os dois mundos, se vê cheio de questionamentos e dúvidas quanto os
caminhos a seguir e as formas de se portar na sua terra natal. É também
confrontado à vida citadina, onde os hábitos dos senegaleses são influenciados
pela cultura europeia e que negam suas tradições em prol de um determinado
modelo cultural e social formulado acima do Equador.
A fonte das mulheres (Radu Mihaileanu,
2011) Duração: 135 minutos
Sinopse: Andar ladeira acima percorrendo um caminho hostil e traiçoeiro para buscar água da única fonte potável que serve o vilarejo, arriscando suas próprias vidas. Essa é a rotina de mulheres de uma comunidade imaginária do Norte da África. Cansadas da rotina árdua e perigosa de trabalho, observadas passivamente pelos maridos, elas resolvem se rebelar de maneira ousada. Surgem então conflitos diversos durante os quais os papéis femininos e masculinos são renegociados. A tradição e a modernidade, o religioso e o secular se traduzem em revolução intensa que irá mudar definitivamente os rumos dessa aldeia e incitar o espectador a instigantes reflexões.
Jaguar (Jean Rouch, 1967) Duração: 110 minutos
Sinopse: Filmado
em 1954, mas sincronizado em 1967, conta a história dos nigerianos Lam, Illo e
Damouré que, estimulados por Rouch (que nessa época estudava o sistema de
imigração para a Costa do Ouro, hoje Gana), partem de seu vilarejo para se
aventurar em Gana, então colônia inglesa. O filme traça as peripécias pelas
quais passam os três. Na época não existia som sincronizado, mas Rouch dá voz
aos seus sujeitos mais de dez anos depois, da maneira mais inusitada: o filme é
projetado e os seus reais personagens fazem “um esforço de memória” e
reconstituem a aventura que haviam vivido quase dez anos antes.
Drum (Zola Maseko, 2004) Duração: 104 minutos
Sinopse: “Drum”
é um filme sobre a vida de Henry Nxumalo (Tave Diggs), jornalista de
investigação famoso nos anos 50 em Sophiatown: bairro símbolo da resistência
cultural em Joanesburgo. Trabalhando na popular revista “Drum”, Henry utiliza
seu emprego para revelar as condições em que viviam os negros neste período. A
luta pelos direitos da sociedade fica estampada com as denúncias da revista.
Por meio destes acontecimentos percebe-se o cotidiano dos negros durante os
anos de segregação do racismo colonial. O filme recebeu diversos prêmios, mesmo
sendo o primeiro longa-metragem do diretor.
Taafe Fanga, o poder
de saias (Adama Drabo, 1997) Duração: 103 minutos
Sinopse: O
filme narra a história dos Dogon, estabelecidos na falésia de Bandiagara.
Quando uma mulher tem em suas mãos a máscara pertencente aos espíritos, ocorre
uma transgressão da ordem social dessa sociedade. Inicia-se uma total inversão
dos papéis, as mulheres, antes submissas, tornam-se senhoras de seus próprios
anseios, confrontando os homens. Essa simbologia ditará uma transformação nos
rumos desse povoado, será que essa nova ordem permanecerá?
Filme Mulheres do Cairo
Sinopse: Trata-se
de material didático para o ensino de História da África, produzido em 2009
durante o curso de Licenciatura em História da UFRJ, pelos professores Mônica
Lima e Amilcar Pereira e pelos licenciandos Fernando Berçot e Martha de Freitas.
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Em breve parte II com a inclusão de mais filmes
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