sábado, 28 de março de 2015

O cinema africano no espaço escolar (parte I) - Texto especialmente escrito para o Blog


O cinema africano no espaço escolar


                                                         Washington Santos Nascimento*


O uso do cinema em sala de aula constitui-se uma ferramenta indispensável para o entendimento da história africana. Nos últimos anos o grande público tem assistido a uma grande quantidade destes filmes, sobretudo filmes de ação como Falcão Negro em perigo (2002, Ridley Scott), Lágrimas do Sol (2003, Antoine Fuqua), Hotel Ruanda (2004, Terry George), O Senhor das Armas (2005, Andrew Niccol), Diamante de Sangue (2006, Edward Zwick) e O Último Rei da Escócia (2006, Kevin Macdonald). Romances como Amor sem fronteiras (2003, Martin Campbell), A Massai Branca (2005, Hermine Huntgeburth). Dramas: O Jardineiro Fiel (2005, Fernando Meirelles), A Intérprete (2005, Sidney ,Pollack) e Babel (2006, Alejandro González Iñárritu).
Entretanto estes filmes se passam na África, mas geralmente os protagonistas não são africanos, ou seja, o cenário é o continente africano, mas seu povo não é protagonista. Normalmente tais filmes apresentam duas vertentes básicas, que não se excluem, acabam por sendo complementares, primeiro são filmes que vitimam o africano, destituindo-os de sua capacidade política, como seres passivos, vítimas, incapazes de mudar seu destino, o destino do seu país e continente, por isto precisam da ajuda humanitária dos países desenvolvidos.
Em uma segunda linha, mas complementar em relação à primeira, são em grande parte filmes que ressaltam a África enquanto um espaço de pobreza, ditadores, tráfico de armas, guerras civis, violência, selvageria... Fazendo uso assim de imagens canônicas (imagens-padrão), estereotipadas e continuamente reiteradas em relação ao continente africano.
Neste cinema comercial há também um segmento a parte, que são os filmes em torno de Nelson Mandela, que de certa maneira acaba também reiterando determinados estereótipos com uma idealização (em graus variáveis) em torno do líder sul-africano, a exemplo de Mandela: Luta pela Liberdade (2007), Mandela ( 2009 de Justin Chadwick) e Invictus (2010, Clint Eastwood).  Isto sem falar do sem numero de filmes infantis, que vão do Rei Leão (1994, Roger Allers) a Madagascar (2005, Eric Darnell). Mesmo nestes filmes o reforço das imagens do continente africano enquanto espaço exótico e selvagem é recorrente.
Excluindo-se algumas produções pontuais e vinculadas aos centros mais antigos, como por exemplo o Egito, o cinema africano, sobretudo dos países de colonização portuguesa, surgiu por volta da década de 60 do século XX ele foi de alguma forma resultado das lutas dos povos africanos pela independência e eles são instrumentos indispensáveis para um mergulho no mundo africano, com suas mazelas, questões, mas também com a beleza de sua diversidade.
A partir de nossa participação em fóruns de discussão como o Núcleo de Apoio a Pesquisa Brasil África da USP (http://brasilafrica.fflch.usp.br/)  e o GT de Africa da ANPUH e de suas listas de pesquisa e eventos como mostras de cinema realizadas na UFMG, UFBA, UFRJ, UFF, PUC-SP, USP..., Bem como a análise de alguns sites e blogs voltados ao cinema africano, como cine-africa.blogspot.com.br, guerracolonial.home.sapo.pt/filmografia/filmes.html e mostraafricahoje.blogspot.com.br/
Além disso a nossa experiência de docente na área desde 2007 selecionamos uma série de filmes e curtas que podem ser úteis em sua utilização em sala de aula. Trata-se de uma relação bem parcial e de certa maneira precária, diante da diversidade que é a produção cinematográfica africana, além do que é uma tarefa desafiadora, fazer uma relação de filmes sobre um continente inteiro.
Não se constitui tarefa nossa fazer uma discussão sobre a utilização metodológicas destes filmes, mas é sempre bom lembrar que quase sempre o filme é utilizado como uma ilustração do conteúdo dado, entretanto o filme, entendido enquanto uma produção artística e cultural, pode e deve ser  bem mais do que uma ilustração. Além disto ele deve transcender a sala de aula, adentrando em todo o espaço espaço escolar com a construção por exemplo de mostras de cinemas.
Abaixo listamos uma serie de filmes e curtas, divididos em diferentes temáticas, e em alguns casos os links para alguns trailers.  Provavelmente alguns dos links colocados neste texto podem estar desativados quando vocês forem acessar, minha sugestão é colocar o nome do filme completo no google ou youtube que provavelmente ele será novamente localizado.


África Ocidental

 Kiriku e a feiticeira: Direção: Michel Ocelot. Kirikou et la sorcière, França/Bélgica,1998.

Sinopse: Kiriku é um menino que já falava quando ainda estava na barriga da mãe. A história faz parte da cultura africana e trata da determinação na luta pela liberdade. “Kiriku nasce para ser livre, tanto que quando ainda está na barriga da mãe ele diz: “Mãe, dê a luz a mim!” Segundo o diretor e roteirista Michel Ocelto, foi também uma grande oportunidade para mostrar o povo africano e alguns de seus valores. O roteiro foge do óbvio, ao contrário do que acontece em outras produções do gênero. E conta ainda com boa trilha sonora e personagens cativantes”.
Público Alvo: Fundamental II
Trailer:
# É possível achar o filme complete na livraria paulinas ou mesmo no youtube


Colonialismo na África

A Batalha de Argel:  (Argélia e Itália, 1966)

Sinopse: Dirigido pelo italiano Gillo Pontecorvo (1919 - 2006), o filme apresenta momentos decisivos da guerra pela independência da Argélia (1954 - 1962), marco no processo de libertação das colônias africanas. Enfocando o período entre 1954 e 1957, o longa-metragem mostra como agiam os dois lados do conflito: o exército francês recorria à tortura e à execução dos inimigos e a FLN (Frente de Libertação Nacional) usava técnicas de guerrilha e de terrorismo.
Público Alvo: Ensino Médio

O Herói ( Zezé Gamboa, 2004)

Sinopse: Após uma violenta guerra civil de 27 anos, Angola encontra-se numa situação em que tudo está por refazer. A reconstrução Nacional passa necessariamente pelo reencontro de valores morais e pela reintegração de seres por vezes perdidos e mutilados física e espiritualmente, que precisam encontrar o seu lugar como elementos válidos de uma sociedade, ela própria em reanimação, e reencontrar a sua dignidade como humanos.



Apartheid

Distrito 9

Sinopse: Um blockbuster com idéia, diretor e elenco sul-africanos. uma nave alienígena 'encalha' sobre a cidade de Johannesburg. os seus milhares de tripulantes acabam isolados num gueto, submetidos à violência da polícia local e negociando com contrabandistas. curioso paralelo com o apartheid, neste bom filme produzido por Peter Jackson)



África Contemporânea

Mãe dos Netos (de Isabel Noronha)

Sinopse:  "Mãe dos Netos” é uma das inúmeras histórias resultantes do drama do HIV/AIDS em Moçambique que, inexoravelmente, vai rasgando o tecido familiar criando um vazio de figuras adultas e deixando nas mãos dos idosos o cuidado de um sem número de crianças.
Usando como técnica uma mistura de animação e documentário, este pequeno filme narra a história de Vovó Elisa cujo filho e as respectivas oito esposas faleceram, deixando ao seu cuidado crianças
.

Karingana Wa Karingana, era uma vez “Ngwenya” (Isabel Noronha)

Sinopse:  Mais do que um filme sobre a vida e obra do Pintor Malangatana, este filme é uma viagem ao universo de um Homem que, não só se tornou um mito, como criou, mais do que uma linguagem artística própria, uma verdadeira Língua para escrever um mundo inscrito dentro de si. 

Le Mandat (De Sembene Ousmane de 1986)

Sinopse: De Sembene Ousmane. Com Isseu Niang, Mamadou Zerbo. Drama em cores/86’. Em Dakar, Ibrahima Dieng, muçulmano senegalês, vive bem, sem trabalhar, com suas 2 esposas e seus 7 filhos. Um dia, recebem um vale-postal de um sobrinho que vive na França. Todos ficam sabendo, as mulheres compram a crédito, os parentes pedem colaborações e outros tentam extorquir o dinheiro. O vale-postal, simples pedaço de papel, em vez de trazer riqueza e gratidão, torna-se símbolo de vergonha e decadência. O filme é um retrato engraçado e contundente da nova sociedade senegalesa.

Fintar o Destino (Fernando Vendrell de 1997)

Sinopse: A amarga crónica de um homem que perdeu a oportunidade de sair de Cabo Verde para ser futebolista no Benfica e nunca conseguiu ultrapassar, ao longo de toda uma vida, a sensação de frustração e vazio. "Fintar o Destino" é o envolvente retrato humano e psicológico de um homem que fica face a face com o vazio da sua vida, marcada pela nostalgia amarga dum passado falhado como futebolista. Uma primeira obra de Fernando Vendrell, construida com sensibilidade e inteligente ironia.

Mulheres Africanas

Sinopse: Este documentário apresenta a trajectória de lutas e conquistas históricas das mulheres africanas em diferentes países do continente. São retratadas não apenas mulheres líderes que se têm destacado em diferentes áreas, mas também as mulheres comuns, igualmente corajosas e vitoriosas em suas lutas do dia-a-dia. Conta com depoimentos de grandes líderes como Graça Machel, Leymah Gbowee, Sara Masasi, Nadine Gordimer e Luisa Diogo.

Trailer aqui


A Guerra da Água
Sinopse: Quatro histórias cruzam-se numa aldeia moçambicana. Histórias sobre a importância de uma lata com água, de um poço que se avaria, de um caçador solitário, de um pássaro que, dentro de uma gaiola, se transforma num celular. A atravessar todas estas histórias, a dignidade nos olhares das pessoas. São três as personagens deste documentário: o poço, as mulheres e o embondeiro. Um filme mágico.


Oxalá cresçam pitangas (2007, 62')

Sinopse: Documentário dirigido pelo escritor angolano Ondjaki e pelo cineasta, também angolano Kiluanje Liberdade. O documentário propõe uma viagem por Luanda, independente de Portugal há mais de 30 anos. Através dos 10 personagens descobrimos ocruzamento de várias realidades e gente de todas as províncias a formar um elo com o resto do mundo

Trailer
https://www.youtube.com/watch?v=17BJfqWfm3c

Sobre o filme


 E não havia mais neve (Abacar Samb Makharam, 1965) Duração: 22 minutos

Sinopse: O filme retrata a volta de um estudante africano para Senegal, seu país de origem, depois de uma grande temporada em Paris. O regresso deste jovem coloca em relevo todos os conflitos e tensões que envolvem a disputa de valores, costumes e tradições entre a Europa Ocidental e a África. O jovem, dividido entre os dois mundos, se vê cheio de questionamentos e dúvidas quanto os caminhos a seguir e as formas de se portar na sua terra natal. É também confrontado à vida citadina, onde os hábitos dos senegaleses são influenciados pela cultura europeia e que negam suas tradições em prol de um determinado modelo cultural e social formulado acima do Equador.

 A fonte das mulheres (Radu Mihaileanu, 2011) Duração: 135 minutos

Sinopse: Andar ladeira acima percorrendo um caminho hostil e traiçoeiro para buscar água da única fonte potável que serve o vilarejo, arriscando suas próprias vidas. Essa é a rotina de mulheres de uma comunidade imaginária do Norte da África. Cansadas da rotina árdua e perigosa de trabalho, observadas passivamente pelos maridos, elas resolvem se rebelar de maneira ousada. Surgem então conflitos diversos durante os quais os papéis femininos e masculinos são renegociados. A tradição e a modernidade, o religioso e o secular se traduzem em revolução intensa que irá mudar definitivamente os rumos dessa aldeia e incitar o espectador a instigantes reflexões.

Jaguar (Jean Rouch, 1967) Duração: 110 minutos

Sinopse: Filmado em 1954, mas sincronizado em 1967, conta a história dos nigerianos Lam, Illo e Damouré que, estimulados por Rouch (que nessa época estudava o sistema de imigração para a Costa do Ouro, hoje Gana), partem de seu vilarejo para se aventurar em Gana, então colônia inglesa. O filme traça as peripécias pelas quais passam os três. Na época não existia som sincronizado, mas Rouch dá voz aos seus sujeitos mais de dez anos depois, da maneira mais inusitada: o filme é projetado e os seus reais personagens fazem “um esforço de memória” e reconstituem a aventura que haviam vivido quase dez anos antes.

Drum (Zola Maseko, 2004) Duração: 104 minutos

Sinopse: “Drum” é um filme sobre a vida de Henry Nxumalo (Tave Diggs), jornalista de investigação famoso nos anos 50 em Sophiatown: bairro símbolo da resistência cultural em Joanesburgo. Trabalhando na popular revista “Drum”, Henry utiliza seu emprego para revelar as condições em que viviam os negros neste período. A luta pelos direitos da sociedade fica estampada com as denúncias da revista. Por meio destes acontecimentos percebe-se o cotidiano dos negros durante os anos de segregação do racismo colonial. O filme recebeu diversos prêmios, mesmo sendo o primeiro longa-metragem do diretor.

Taafe Fanga, o poder de saias (Adama Drabo, 1997) Duração: 103 minutos

Sinopse: O filme narra a história dos Dogon, estabelecidos na falésia de Bandiagara. Quando uma mulher tem em suas mãos a máscara pertencente aos espíritos, ocorre uma transgressão da ordem social dessa sociedade. Inicia-se uma total inversão dos papéis, as mulheres, antes submissas, tornam-se senhoras de seus próprios anseios, confrontando os homens. Essa simbologia ditará uma transformação nos rumos desse povoado, será que essa nova ordem permanecerá?

Filme Mulheres do Cairo




Tombuctu: a cidade dos livros de Amilcar Pereira

Sinopse: Trata-se de material didático para o ensino de História da África, produzido em 2009 durante o curso de Licenciatura em História da UFRJ, pelos professores Mônica Lima e Amilcar Pereira e pelos licenciandos Fernando Berçot e Martha de Freitas.


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Em breve parte II com a inclusão de mais filmes



* * Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo. E-mail: washingtonprof@gmail.com

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